Danúbia Otobelli e Gissely Lovatto Vailatti

Danúbia Otobelli e Gissely Lovatto Vailatti

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Faça-se a luz! A energia elétrica chegou

Em 1º de janeiro de 1928 a iluminação pública passou a ser elétrica e os lampiões deixaram de existir

Ainda que em 1879 Thomas Edison tenha inventado a lâmpada, nessa mesma época, em nossa região, uma escuridão sombria permeava as noites. O desconhecido, o isolamento, os sons noturnos e a imaginação despertavam temores, criavam visões, atormentavam o bem-estar e a segurança de cada lar que se constituía formado pelos imigrantes que gradativamente aqui se estabeleciam. O fogo aquecia e afugentava os animais, mostrava-se como sinal de proteção, comunicação e tornava visível o breve entorno. As noites pareciam intermináveis. Era preciso angariar formas de adquirir querosene, minimamente o necessário para acender pequenos ‘ciaretos’ e lampiões. 
Em busca de soluções para minimizar o desconforto, Giovanni Conte, residente em Mato Perso, aperfeiçoou-se na arte de produzir velas. O artefato, há tempos conhecido na Europa, utilizado em castelos, igrejas e monastérios, era artigo de luxo nas casas dos humildes camponeses. Com um pouco de conhecimento agregado à criatividade arriscou o que se pode considerar uma exclusividade para o lugar. Tendo por suporte uma roda de carroça, fixou pregos distantes cerca de um palmo longe um do outro e neles amarrava barbantes. Num tacho aquecido sobre uma fogueira derretia cera de abelha. Com uma concha grande derramava lenta e repetidamente o líquido sobre os barbantes até que cada um alcançasse o diâmetro desejado. Não faltava trabalho, a labuta era intensa para atender a necessidade da família e da vizinhança.
Na sede da pacata Vila de Nova Trento, não foi diferente, outras soluções foram sendo buscadas. A iluminação das ruas também era necessária e com ela seria alterado todo o cotidiano. Por volta de 1900 foram instalados 16 lampiões abastecidos diariamente a querosene por um funcionário da subintendência. O combustível era suficiente para três horas, iluminando as quatro quadras centrais das 19h às 22h no inverno e das 20h às 23h no verão. O serviço era feito pelo acendedor de lampiões, cuja função era acionar a chama no início da noite e apagá-la na madrugada, substituir os pavios de estopa, repor o combustível e limpar os vidros quando recobertos pela fuligem. Por esse serviço, a partir de 17 de outubro de 1927, a viúva de José Dal Zot passou a receber a razão de 7$500 Réis por cada lampião aceso.
Em 1º de janeiro de 1928 a iluminação pública passou a ser elétrica e os lampiões deixaram de existir. Foram instaladas três lâmpadas de 100 velas em cada quadra e rede particular nas casas, geradas por uma usina termoelétrica, movida por dínamo do antigo Moinho Mascarello. Em março do ano seguinte, o engenheiro Lauro Moura e Cunha examinou as quedas d’água existentes no município para possível instalação de uma hidrelétrica. Na mesma época, a Companhia Sul-Americana de Eletricidade-AEG, mediu o potencial hidráulico do Arroio Curuzu, Rio das Antas e Arroio São Marcos.
Em 1931, Jacob Maestri e Ângelo Antoniazzi instalaram uma nova usina de força, situada na Rua Ernesto Alves, em um prédio de dois andares. Lá trabalhavam também dois funcionários, Braga e Olinto Rizzon. Surgiram os postes de iluminação pública, ziguezagueando o lado e o meio da Rua Principal. A usina era movida a gás pobre (lenha) e a máquina alemã foi adquirida em Caxias do Sul, sendo transportada para cá em etapas, pelo carreteiro Angelo Faccio. Foi uma grande inovação, funcionava das 8h às 24h. Aos domingos, para as projeções do Cine Central, contavam também com um motor movido a gasolina de propriedade da recém-fundada firma de Alexandre Micheletto.
A usina foi encampada pela prefeitura municipal na administração do prefeito Otto Bélgio Trindade (24/1/1941 a 5/12/1946). Para gerenciá-la foi contratado Orestes Pradella, auxiliado por Braga (nome não identificado), Angelo Corradi e Atílio Montanari, funcionando dia sim, dia não. Foram adquiridos os 130 medidores de luz e força, a casa da usina e seus respectivos terrenos. De acordo com o plano estadual de eletrificação, na mesma época foi realizada a ligação da linha de transmissão de energia entre Caxias do Sul e Flores da Cunha, servida pela Usina do Passo do Inferno.
Todavia, às necessidades geradas pela instalação da Metalúrgica Gladiador, que fabricava cartuchos de latão para armas de caça, isqueiros, máquinas de fazer massa, bombas de chimarrão, fivelas para sapatos, freios de carroça, lanternas tipo pescador, frigideiras, entre outros utensílios, requeria o funcionamento da usina sem interrupção. Prevendo a instalação de mais indústrias, a prefeitura ampliou a potência geradora, adquirindo um motor a diesel elétrico, passando a atender aproximadamente 250 consumidores, com potência de 220 volts.

Curiosidade

Contam que o barulho do motor provocado pela antiga usina da cidade motivou um fato pitoresco. Quando em 22 de março de 1950 a usina foi encampada pela Companhia Estadual de Energia Elétrica - CEEE, um morador da cidade que residia nas imediações da antiga usina, acostumado com o barulho constante por anos consecutivos, solicitou que o motor permanecesse ligado à noite, ao menos por algum tempo, para se acostumar com o silêncio, pois não conseguia mais conciliar o sono. 

 

 

Postes de iluminação em um trecho da Rua Dr. Parobé (atual Av. 25 de Julho) nos anos 1950.