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Manter ‘estado de flow’ pode ser maior diferencial para retenção de equipes de TI

O termo define o estado atingido por um indivíduo quando suas habilidades adquiridas são suficientes para enfrentar os desafios encontrados

Talvez você já tenha ouvido falar do ‘flow’. O termo define o estado atingido por um indivíduo quando suas habilidades adquiridas são suficientes para enfrentar os desafios encontrados. Sabe aquele momento em que as crianças conseguem ficar super entretidas com um brinquedo? O flow tem um pouco dessa cara e desse sentimento de imersão e concentração.
Esse tipo de sensação foi bastante pesquisada e conceituada por Mihaly Csikszentmihalyi, que defendia que o ‘estado de flow’ poderia acontecer conforme as habilidades e os desafios das pessoas aumentassem, de modo proporcional. Caso os desafios fossem muito mais altos que as capacidades, as grandes chances de frustração ou ansiedade aumentavam. Da mesma maneira, desafios muito inferiores à capacidade de alguém poderia levar à perda de interesse e aborrecimento com a atividade, tornando-a entediante. 
Por isso, não é uma coincidência que o termo ‘estado de flow’ seja bastante usado também na área de desenvolvimento de games, referindo-se àquele momento “mágico” de imersão causado por um jogo. Tanto é que o objetivo de quase todo jogo digital, hoje em dia, é encontrar maneiras de adaptar a jogabilidade à capacidade do jogador, com uma grande variedade de seletores de dificuldades. O objetivo principal é manter quem joga o mais próximo possível do ‘estado de flow’. Caso contrário, o risco é que o jogador abandone o game, seja por tédio (desafios muito fáceis) ou frustração (obstáculos muito difíceis).
E da mesma forma que a vida imita a arte, pode ser que o mundo do trabalho possa se beneficiar de imitar o mundo dos games. Tenho percebido que muitos dos meus alunos de graduação das áreas de ciência da computação e sistemas de informação, durante discussões sobre motivação de equipes nas aulas da disciplina de Engenharia de Software, têm relatado uma troca frequente de trabalhos, pulando de empresa em empresa com uma velocidade bastante impressionante.
Ainda que tenha havido um momentâneo freio das contratações, a área de tecnologia segue sendo um setor muito aquecido, e com uma carência de profissionais que promete se manter na casa dos seis dígitos até 2025. Este cenário de escassez de profissionais coloca uma enorme pressão na contratação das empresas. Além de recrutadores especializados (tech recruiters), elas têm apostado em benefícios que vão desde a criação de ambientes de trabalho divertidos, oferta de comida grátis, salários competitivos e até pagamento em dólar. Ainda assim, as taxas de turnover, que medem o movimento de saída de colaboradores, seguem altas, na casa dos dois dígitos, demonstrando que enquanto o déficit da mão de obra do setor não for resolvido e a formação de novos profissionais se mantiver abaixo da demanda de mercado, os salários se manterão altamente competitivos. 
A chave, nesse ponto, seria manter um olhar atento para o gráfico da teoria flow, incentivando gestores e líderes a buscar maneiras de equilibrar os desafios das corporações e as habilidades dos seus times. A “missão” do “jogo da gestão” seria evitar que as pessoas da equipe ficassem frustradas ou entediadas com as tarefas, mantendo-se envolvidas em suas funções de uma maneira positiva e energizante. 
Isso não significa que os desafios devem ser “minimizados” ou reduzidos, até porque, muitas vezes, isso não é nem possível. O ideal seria dar às lideranças competências para que possam estar atentas a esse alinhamento entre a complexidade do desafio e as capacidades dos times.
O segredo não é pensar em gamificar o trabalho, mas entender que um engajamento intrínseco com as atividades - que todo videogame tem como meta - é um excelente diferencial entre trabalhar para a sua empresa ou encontrar um desafio na concorrência.

João Mossmann
Diretor do Instituto de Ciências Criativas e Tecnológicas (ICCT) da Universidade  Feevale

Fonte: Adaptado por João Mossmann (2022) a partir de The Art of Game Design: A Book of Lenses (A Arte De Game Design)